5.19.2010

Jesus ama os gays


Tenho dito que, desde que me entendo por gente, nunca se discutiu tanto os direitos dos homossexuais como em 2010. Só este ano, no âmbito jurídico, o STF permitiu a adoção de filhos por casais gays, o Itamaraty passou a conceder passaportes diplomáticos para companheiros de servidores homossexuais e tramita na Câmara uma lei que condena a homofobia. Já na mídia, a Rede Globo de Televisão, a mais assistida do país, colocou em horário nobre três homossexuais no reality show Big Brother Brasil, a Revista Veja, a mais lida, estampou em sua penúltima capa os jovens que, cada vez mais cedo, saem do armário com o apoio dos pais. Até mesmo o cantor Ricky Martin, ídolo pop, resolveu assumir sua condição publicamente. Fora isso, outros programas de televisão e revistas de educação têm dado destaque ao assunto. Não discutem as causas da homossexualidade, nem se é escolha, condição ou parte da genética de cada indivíduo. Mas cada vez mais apontam para a necessidade do país igualar os direitos daqueles que optaram por viver e compartilhar a vida com outra pessoa do mesmo sexo.

Muitas escolas públicas e particulares já trabalham o tema abertamente. Aliás, desde 2004, o Governo Federal sustenta o Programa Brasil sem Homofobia e, em Belo Horizonte, o Projeto Educação sem Homofobia insere-se no âmbito da Formação de Profissionais da Educação para a Promoção da Cultura de Reconhecimento da Diversidade Sexual e da Igualdade de Gênero. Belo Horizonte, aliás, é a primeira capital brasileira a discutir e adotar o uso do nome social de travestis e transexuais nos registros escolares. A UFMG também realiza todos os anos a semana da diversidade sexual, com palestras e debates sobre o assunto.

Mas o que acontece com as escolas religiosas? Responsáveis pela formação da maior parte dos filhos da classe média alta, as elas formam a futura elite do Brasil e pecam na abordagem de alguns temas que hoje já fazem parte do cotidiano de muita gente. Muitas vezes presas a valores e dogmas que não evoluem com o tempo, elas preferem se omitir quando este é o assunto. Não que façam isto com todos os marginalizados. Por serem religiosas, há o olhar cristão para o social. Não com entendimento sistêmico de organização da nossa sociedade, mas cristão. A Bíblia dá ênfase aos marginalizados e cita amar ao próximo como a si mesmo, mas quase não cita os homossexuais. Os pobres, por exemplo, são assistidos por vários programas sociais mantidos por instituições religiosas e filantrópicas. O racismo e a questão indígena também são debatidos em algumas escolas. Muitas delas, inclusive, ajudam aldeias indígenas e quilombolas. Mas isto não acontece com os homossexuais.

Muitos alunos sofreram bullying na infância e na adolescência dentro dos próprios muros da instituição. E muitos continuam a sofrer. E o tema continua velado. Hoje em dia, não se discute mudar o indivíduo para que ele seja aceito pelo meio. O que se discute (e o que é mais difícil em se tratando de práticas pedagógicas) é de mudar o meio para aceitar o indivíduo “diferente”. Talvez por medo de repúdio dos pais dos alunos, talvez por preconceito vindo dos próprios profissionais, talvez por falta de conhecimento da evolução do pensamento humano a escola religiosa pouco avança neste sentido. Existem registros de homossexualidade desde remotas civilizações. E hoje, em vários países europeus, a união civil de homossexuais já é realidade. Em Buenos Aires, pela primeira vez na América do Sul, os gays também têm direito à união civil. Esta é a tendência de praticamente todos os países ocidentais. E a tendência é que cada vez mais países aprovem igualdade de direitos.

Um recente caso que merece destaque aconteceu com uma faculdade particular em Minas não religiosa. Ela teria vetado a divulgação de um cartaz da 7ª semana Acadêmica do Serviço Social (sob o tema "Fortalecer as lutas sociais para romper com a desigualdade") em que, além de imagens de negros, índios, deficientes físicos e sem-terras, exibia a de duas mulheres se beijando. Segundo alunos e professores, a direção exigiu que a coordenadora retirasse a imagem das duas meninas, ela se recusou e foi demitida. O fato gerou protestos em várias organizações de apoio à diversidade sexual.

Contrários ou não, não há como mais fugir mais desta questão. A mídia, a escola e a família têm papéis fundamentais na construção de valores e de mentes. Se a escola religiosa não se apressar na mudança de valores e na maneira como lida com as diferenças, ela pode passar por uma crise tão grande como a que a Igreja Católica atualmente sofre. Ao se esquivar da nova forma como a sociedade se organiza, ela pode ser acusada de omissão e se perder em valores que o mundo não mais compartilha.

5.13.2010

Coisas de índio


Em entrevista que fiz para a Revista Raízes, voltada aos alunos do Colégio Santa Dorotéia, o índio Daniel Mundukuru diz que não é possível separar a cultura brasileira da indígena. Ele nasceu em 1964, em Belém do Pará, na nação tupu mundukuru. Formado em Filosofia, com licenciatura em História e Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP), Daniel atuou durante 10 anos como educador social na Pastoral do Menor de São Paulo. É autor de vários livros sobre os costumes e a cultura indígena, como “Coisas de Índio” e “Contos indígenas brasileiros”, além de outras 31 obras publicadas. Entre outras atividades, participa ativamente de palestras e seminários destacando o papel da cultura indígena na formação da sociedade brasileira. Na entrevista realizada por e-mail, Daniel Mundukuru diz que a cultura indígena faz parte da formação da identidade brasileira e que o Brasil ainda tem uma dívida grande com aqueles que foram os primeiros habitantes do país.

O que representa hoje a comemoração do Dia do Índio? Por que comemorar a data?

DM: Hoje em dia não é mais correto falar do índio como se fosse um todo homogêneo. Esta generalização foi criada a partir de uma ficção que dizia que os portugueses haviam chegado às Índias e, por isso, seus habitantes eram índios. O que não se sabia à época é que o Brasil que os portugueses avistaram era a morada de milhões de pessoas pertencentes a diferentes povos que falavam diferentes línguas. Hoje, mesmo depois de tanta violência praticada pelos colonizadores, esta diversidade está assegurada e é preciso lembrar à sociedade brasileira que não existe mais o índio, mas diversos povos. Seria interessante considerar o “Dia do Índio” um momento de esclarecimento, de conscientização da sociedade sobre a real situação destes povos dentro desse nosso país que teima em esquecê-los e excluí-los.

A presença cada vez mais constante do homem branco nas tribos gera problemas? Como os indígenas absorvem a cultura das metrópoles?

DM: Esta pergunta valeria uma vida inteira para ser respondida. Imaginemos, porém, que a situação hoje não mudou muito desde 1500. Grupos econômicos continuam invadindo as terras indígenas para delas tirarem a riqueza (ouro, diamantes, minérios) e seus conhecimentos tradicionais através da biopirataria (plantas, ervas). As igrejas e religiões continuam dando ordem e destruindo a alma dos indígenas que estão respondendo a isso com suicídios, alcoolismo e aumento da violência doméstica e diminuição de sua esperança de viver.
Todas estas dificuldades estão aliadas à constante aproximação com a perigosa sociedade do consumo que vem obrigando as populações indígenas a adotarem um comportamento que não é tradicional. Isso gera novos desejos e necessidades de satisfação. Claro que não há nada de mal em desejar conhecer a tecnologia e os avanços da ciência, mas é preciso ter clareza de que muitas coisas da cultura indígena são incompatíveis com o mundo do ocidente.

Qual foi a contribuição mais importante da cultura indígena na formação da sociedade brasileira como conhecemos hoje?

DM: Penso que é muito difícil avaliar isso. Penso que a cultura indígena está no âmago do brasileiro. Não dá para separar a cultura brasileira do ser indígena. O “índio” não é brasileiro. O brasileiro é que é “índio”. E pronto.

Você percorre muitas cidades, já lançou diversos livros e também tem acesso à internet. O que a modernidade oferece de melhor e o que oferece de pior?

DM: Modernidade nem sempre é sinônimo de coisa nova. A comunicação à distância era uma técnica dominada por muitos povos. Havia uma evolução mental que ia chegar mais longe que a Internet. Acontece que o Ocidente brecou esta capacidade humana, criando nela o sentido da urgência. Ficamos todos escravos da tecnologia e nos esquecemos de crescer interiormente. Os povos indígenas estavam na direção dessa evolução interior, mas foram de fato “atropelados” pelo progresso.
O que temos agora é essa comunicação tecnológica. Eu não sou contra ela, ao contrário. Ela tem ajudado nossos povos a se apresentarem à sociedade brasileira. Através do domínio destas técnicas, nossos povos vão reforçando a própria memória ancestral. Tenho dito sempre que a memória precisa se atualizar para manter-se viva. O manuseio da tecnologia é fundamental para que isso aconteça.

Existem muitos escritores indígenas como você? Como é a literatura indígena?

DM: A literatura indígena é relativamente recente. Tem pouco mais de 10 anos. Ela é um jeito especial de olhar para o mundo a partir do modo indígena de ser. É uma forma de tornar o pensar indígena mais conhecido e respeitado por todos. Há cerca de duas dezenas de escritores espalhados pelo Brasil que estão produzindo lindos livros para crianças e jovens. Muitos escolhem o caminho da literatura infantil e juvenil por carregarem consigo a esperança de “fazer” a cabeça da sociedade brasileira a favor de nossos povos.

Muitos falam que o governo e o povo brasileiro têm uma dívida enorme com as populações indígenas pela matança, exploração e tomada de terras. Você compartilha dessa opinião?

DM: Não sou do tipo que pensa em pagamento retroativo, mas acho sim que o Brasil – como nação que se construiu sobre os corpos de muita gente pobre e excluída – tem uma dívida que teria que ser paga. Como? Demarcando as terras que ainda não o foram, abrindo linhas de crédito para as comunidades que estão vivendo nas cidades grandes, reforçando a política de cotas para indígenas, absorvendo os indígenas formados no mercado de trabalho, apoiando as iniciativas indígenas em prol da formação, da profissionalização, criando políticas culturais próprias para os indígenas, criando a Universidade Indígena e tornando a Funai um órgão administrado pelos próprios indígenas. Isso é pouco, mas já é um começo.

5.10.2010

Entrevista com Maria da Penha


Em entrevista à Revista Integração, Maria da Penha Maia Fernandes, a mulher que deu nome à lei que combate a violência contra a mulher, disse que a lei deve ser considerada um marco social, um verdadeiro avanço no combate à violência doméstica. Segundo ela, problemas de aplicabilidade existem em qualquer lei, mas as vítimas nunca devem deixar de denunciar.


Hoje, após quase quatro anos da sanção da lei que leva o seu nome, qual a avaliação que a Sra. faz dos casos e das denúncias de violência doméstica no Brasil?

Maria da Penha: Acredito que a promulgação da Lei nº 11.340/2006 já pode ser considerada um marco social, tamanha a sua aceitação dentro da coletividade, com marcante recepção nas camadas economicamente mais frágeis da população. Ainda que sob a resistência de uma cultura historicamente machista, a Lei Maria da Penha já desponta como um contrapeso aos abusos criminosos contra as mulheres, até então renegadas ao desconhecido, porque agredidas no “falso” aconchego de um marido, companheiro ou familiar agressor.

Recentemente, em Belo Horizonte, uma cabeleireira foi assassinada pelo ex-marido inconformado com o fim do casamento. Ela já o havia denunciado várias vezes, mas nada de muito relevante foi feito. Na sua opinião, como anda a aplicabilidade da Lei Maria da Penha?

Maria da Penha: Se a lei pode ser considerada um marco, é igualmente inegável que a sua implantação, como espera a parcela feminina cansada do machismo brasileiro, é um processo e, como tal, reclama tempo e persistência de todas as entidades e agentes que militam na frente dos direitos humanos. Foi por isso que, no ano de 2009, lançamos o Instituto Maria da Penha (IMP), que tem justamente essa finalidade: a de servir de alavanca à ampliação, ao incremento e à capacitação de todos aqueles que lidam com a violência, inclusive pelas vias de repressão (como o aparato policial, persecução, tanto a Polícia Judiciária como os membros do Ministério Público), e penalização daquela ilicitude, que diz respeito ao Poder Judiciário.

Você acha que as agressões contra as mulheres ainda são frutos de uma sociedade conservadora? Acredita que este número tende a diminuir nas futuras gerações?

Maria da Penha: Se consideramos que a lei é um marco pelo seu caráter social, também identificaremos no patriarcado histórico do povo brasileiro os maiores desafios para o incremento deste remédio de combate à violência e, como não dizer, à marginalização da mulher. Na medida em que a violência passar a ser enfocada também sob a ótica da textura social, as ações conjuntas de educação, de preservação e de fortalecimento do núcleo familiar pelo cultivo do ser humano fraterno e solidário se somarão ao instrumento jurídico da Lei nº 11.340/2006 e, assim, sistematicamente unidos, tornar-se-ão numa estrutura cada vez mais patente e eficaz na prevenção e repressão do evento criminoso contra a mulher. Tudo, sem que tenhamos que lançar mão – como fazemos atualmente – tão somente do medo da punição como barreira a que novas ocorrências criminosas aconteçam, engrossando as cifras das relações afetivas salpicadas de capítulos violentos e ignoradas pela população, porque dentro da pauta entre “marido e mulher”.

Por que muitas mulheres ainda não denunciam agressões físicas às autoridades?

Maria da Penha: As chamadas cifras sombreadas da violência doméstica sobrevivem, basicamente, por um duplo aspecto: em primeiro lugar, porque as marcas da violência doméstica não maltratam somente o corpo, mas também a alma, através de um senso de vergonha, fragilidade emocional e uma falsa impressão de fracasso familiar. Com efeito, até que o evento violento venha à tona pela agredida, esta se detém muito tempo na reflexão (às vezes, interminável) de que o relacionamento com o algoz pode melhorar e até, ser resolvido, alcançando um patamar ainda não vivido pelos protagonistas da violência doméstica. Quando o agressor está centrado em alguém da família, tal assunto permanece obscuro, porque roupa suja se lava em casa... e assim, as agressões físicas vão se prolongando no tempo. Como se vê, o enfoque de tal cenário volta a se cercar de questões socioculturais. As mesmas que – ante a omissão da ofendida – impedem que terceiros levem a notícia-crime adiante; afinal, é assunto de marido e mulher, dizem muitos, sem pudor. A Lei Maria da Penha, também por isso, se mostra valiosa, pois ao adotar uma postura inegavelmente recriminadora ante o crime contra a mulher, o legislador ordinário recolocou a questão sob os trilhos ideais: a agressão contra a mulher é, sim, assunto de todos, como o é todo e qualquer ato atentatório à dignidade da pessoa humana.

5.06.2010

Ela faz o samba


Entrevista que fiz com a Leci Brandão para a Revista Integração, voltada aos alunos da Ação Social Paula Frassinetti e aos moradores do Morro do Papagaio.

Nascida em Madureira e criada em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, a cantora e compositora Leci Brandão foi a primeira mulher a fazer parte da ala de compositores da Mangueira. Assim como muitos brasileiros de origem pobre, teve de ajudar no orçamento familiar durante muitos anos. Trabalhava durante o dia e estudava à noite. Em 1974, sua paixão pelo samba a fez gravar seu primeiro compacto simples. No ano seguinte, ela gravou seu primeiro LP, muito premiado pela crítica. De lá pra cá, foram 23 discos e várias compilações em vinte e nove anos de carreira. Suas músicas e composições são marcadas por letras em defesa das minorias: estudantes, índios, prostitutas, gays, partidos de esquerda, movimentos de mulheres e, principalmente, o Movimento Negro. Nos últimos quinze anos, todos os discos de Leci contêm uma faixa falando do assunto de forma direta, transparente e apaixonada. Em entrevista à Revista Integração, Leci Brandão diz que, apesar dos obstáculos na carreira artística, nunca deixou as questões sociais de suas letras. “Nunca desisti dos meus objetivos porque entendo que, sendo eu mulher, negra e de origem humilde, tornei minha arte como instrumento de luta”, conta.

Integração: Você foi a primeira mulher a fazer parte da ala de compositores da Mangueira. Naquela época, como era a presença da mulher dentro do samba e na sociedade em geral?

Leci Brandão: Foi em 1971, simbolicamente. Fiz estágio durante um ano compondo sambas de quadra. Em 1972, após ter sido aprovada pela Ala de Compositores, recebi a carteira oficial . Não era comum ter mulher em Ala de Compositores. A única conhecida no Brasil era Dona Yvone Lara, que vencera, no Império Serrano, com samba-enredo. Entretanto, nos anos 70, a mulher já se destacava na sociedade brasileira e as mulheres negras já se manifestavam no Movimento Negro.

Integração: No início restrito às comunidades de periferia, o samba ganhou o Brasil e o mundo. Na sua opinião, o samba e o carnaval perderam a identidade que remete aos negros e pobres do Brasil? Como você avalia o samba hoje?

LB: Com a entrada da transmissão de TV nos desfiles, o formato das Escolas de Samba sofreu transformações. Caiu a importância do Diretor de Harmonia, dos passistas, das baianas e da comunidade. Passou-se a valorizar o carnavalesco, as rainhas de bateria e as "celebridades", gente que se aproveita das Escolas para aparecer na mídia.

Integração: Em 1982, você participava ativamente das campanhas políticas dos partidos de oposição à ditadura militar. Como foi sua relação com o regime?

LB: Minha história de vida prova que meu comportamento não poderia ser diferente. Venho de origem pobre, sempre batalhei para sobreviver e as letras de minhas músicas sempre se identificaram com os movimentos populares. Tive algumas músicas censuradas nos anos 70.

Integração: Você gravou 23 discos em 29 anos de carreira. Por um tempo, parou de gravar por questões políticas, já que as gravadoras não aceitavam suas letras marcadas pelas questões sociais. Para você, a música também tem esse papel de conscientizar e trazer uma mensagem política?

LB: Enfrentei muitos obstáculos na carreira artística, por ser uma cidadã engajada com as questões sociais. Nunca desisti dos meus objetivos porque entendo que, sendo eu mulher, negra e de origem humilde, tornei minha arte instrumento de luta pela comunidade. É minha obrigação.

Integração: A que você atribui essa característica tão forte sua, que é cantar e incluir em seus discos as minorias marginalizadas?

LB: Acredito que seja missão determinada por Deus. Além disto, meus protetores espirituais são Ogum e Iansã, orixás de luta.

Integração: Atualmente, você é membro do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial e do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher. A redução do preconceito contra o negro e a mulher têm evoluído no Brasil?

LB: Sou conselheira apenas da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR). Devemos a criação desta Secretaria ao Movimento Negro, que incluiu, no programa de Governo do Presidente Lula, esta justa reivindicação. Continuamos lutando por muitas coisas: cotas nas universidades, titularização de terras quilombolas, igualdade salarial, respeito das Polícias Civil e Militar, inclusão e acesso às empresas multinacionais. Afinal, o preconceito é racial e não social, como muitos insistem em afirmar.

Integração: Qual mensagem você daria aos alunos e moradores do Morro do Papagaio, em Belo Horizonte?

LB: Minha gente querida do Morro do Papagaio, tive o prazer de conhecer Belo Horizonte no início da minha carreira e pude sentir o carinho e a tranquilidade do povo mineiro. Sei que este estado é rico naturalmente, entretanto nossos ancestrais escravos muito trabalharam e sofreram para aumentar essa riqueza. A população negra de Belo Horizonte é imensa e a situação de pobreza é semelhante. Por esta razão, precisamos nos unir e continuar lutando por nossos direitos. É importante que haja um veículo de comunicação que preste serviços à comunidade, levando consciência política para que se tenha uma vida sobretudo pautada pela dignidade.

5.04.2010

Menores infratores


Gosto de acompanhar as enquetes feitas pela Folha Online. Sempre tem alguma que acaba mostrando um lado vergonhoso da sociedade brasileira. Hoje, me deparei com uma enquete que pergunta ao leitor se ele concorda com a decisão do Tribunal Superior Eleitoral de aprovar uma resolução que permite o voto nas eleições de outubro de presos e jovens infratores. A resolução diz que urnas seriam instaladas nas unidades prisionais. Sem surpresas. Mais de 70% das pessoas são contra a decisão do TSE.

A violência no Brasil é realmente muito grande, mas discutida e combatida de maneira superficial. Ainda é muito comum ver pessoas que defendem a pena de morte ou a redução da maioridade penal, sem levar em conta o contexto em que a violência foi gerada, as suas verdadeiras causas e consequencias. Há pouco mais de um mês, entrevistei Laila Shukair, Promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo, sobre a questão carcerária no Brasil. Ela, radicalmente contra a redução da maioridade penal, me disse que em razão da crescente violência urbana, a mídia e alguns setores da sociedade fazem crer que os jovens, menores de 18 anos, não estão sujeitos à sanção quanto praticam ato algum ato infracional. Segundo ela, o Estatuto da Criança e do Adolescente, além das garantias dos direitos fundamentais, prevê sanção aos jovens infratores, como advertências e medidas socioeducativas. Se o delito praticado pelo jovem for considerado grave, como roubo, tráfico ou homicídio, ele deverá ser segregado da sociedade, isolado e receber medida socioeducativa de internação, para que não retorne à delinquência. “A Lei, de alguma forma, pune o jovem infrator, mas reconhece que, por tratar-se de um ser ainda em desenvolvimento, deverá o Estado, a família e a sociedade garantirem a ressocialização”, diz. Ela ainda completa que “reduzir a idade penal não diminuirá a criminalidade juvenil, agravará a situação do jovem que será colocado em estabelecimento penal, cárcere, presídio com outros adultos, tendo a sua formação comprometida, pois passarão pela escola do crime”.

Ao se isolar em condomínios fechados, onde a presença do pobre e do marginal é praticamente nula, a elite brasileira cada vez mais se esquiva, ignora e se aterroriza com problemas que ela mesma criou. O capitalismo não permite que seus integrantes distingam os pormenores (que neste caso são pormaiores) do modelo. Não há visão global nem sistêmica de pensar que só existe o rico porque existe o pobre e vice-versa. Pensar em redução da maioridade penal não acaba com o problema da violência. Muito pelo contrário. Entope os bueiros do sistema carcerário, que deveriam se chamar “Campos de Concentração”.

Ao perguntar os motivos que era contra a redução da maioridade penal, Shukair me disse que a sociedade não tem acesso a diversas informações que responsabilizam membros do Executivo e do Legislativo como corresponsáveis pela violência. “Também sou contra em razão da maior parte dos estados não ter implementado os programas socioeducativos para os adolescentes infratores. O que isto implica? Se um menino de 13 anos pratica o primeiro furto, a Lei determina que seja encaminhado a um programa socioeducativo para que seja realizado um trabalho com ele e com a família. Como a maior parte dos municípios brasileiros não tem esse programa, o jovem acabará praticando atos infracionais, até que passe a praticar crimes graves, como um roubo com arma de fogo. Tal fato representa delito grave e o jovem deverá, pela Lei, ser encaminhado para as unidades de internação. Acontece que a maioria dos municípios não tem as unidades de internação, e a Justiça acaba encaminhando-o à Unidade localizada na capital do estado, longe da familia e da comunidade, o que impede que seja realizado um trabalho de reintegração e de quebra da situação de delinqüência. Sou contra porque é fantasia achar que problemas complexos se resolvem com medidas simples. Há leitura equivocada da realidade”.

Confira uma parte da entrevista, feita para a Revista Integração.

Por que a senhora supõe que alguns jovens e até mesmo setores da sociedade defendem a redução?

LS: Talvez por desconhecerem que o jovem que pratica crime grave é internado em Unidades que devem realizar atividades pedagógicas. No entanto, a maioria delas tem um perfil prisional e não um perfil pedagógico. Além disso, talvez por desconhecerem que o sistema penitenciário está falido e que se o adolescente estiver no meio dos adultos, ficará exposto às facções criminosas. Talvez por desconhecerem que o jovem, por estar em processo de formação psicológica, deve receber tratamento diferenciado do adulto. Talvez por desconhecerem a realidade da população brasileira, famílias que não têm condições dignas de sobrevivência e filhos em situação de abandono afetivo e material além de serem vítimas de violência. Talvez por desconhecerem que é necessária a prática da prevenção e pelo fato da mídia, ao noticiar a violência praticada pelo jovem, não informar o contexto familiar, social e habitacional em que vive o jovem, muito menos os índices da criminalidade.

Muitas pessoas defendem a redução da maioridade penal pelos casos de homicídios praticados por adolescentes e amplamente divulgados na mídia. O número destes homicídios é alto, se comparado aos outros crimes cometidos por estes jovens?

LS: Dados reais apontam que os delitos graves, como homicídio, são praticados na maioria por adultos e não por adolescentes. A natureza dos crimes praticados pelos jovens é de ordem patrimonial, cerca de 70%. Apenas 1% da infração juvenil está relacionada a homicídio. Apenas os crimes raros e mais cruéis ganham notoriedade devido à divulgação que recebem da imprensa e geram um mito de que os adolescentes são os responsáveis pela violência no nosso país e que são perigosos.

1.29.2010

El Pecado Original - Pablo Milanés




Em uma noite, em Cuba, fui agraciado com esta música. Em um show que fui do incrível cantor Pablo Milanés.

Dos almas
Dos cuerpos
Dos hombres que se aman
Van a ser expulsados del paraíso
Que les tocó vivir.

Ninguno de los dos es un guerrero
Que premió sus victorias con
Mancebos.
Ninguno de los dos tiene riquezas
Para calmar la ira de los jueces.
Ninguno de los dos es presidente.
Ninguno de los dos es un ministro.
Ninguno de los dos es un censor de
Sus propios anhelos mutilados...

Y sienten que pueden en cada
Mañana ver su árbol,
Su parque,
Su sol,
Como tú y como yo...
Entrañas
En la más dulce intimidad con
Amor así como por siempre
Hundo mi carne
Desesperadamente en tu vientre
Con amor también.

No somos Diós.
No nos equivoquemos otra vez.

http://www.youtube.com/watch?v=jCGme7amXD4

1.23.2010

Da série: Palmas pra eles (2)


Vi, por acaso, a história deste indiano no Wikipedia e achei muito interessante. Reproduzo aqui o texto.

Manvendra Singh Raghubir Singh é um hindu pertencente à família real do antigo estado principesco de Rajpipla na Índia. Ele foi deserdado após revelar sua homossexualidade, e desde então tem sido um ponto de interrogação sobre suas relações com a família. É a única pessoa conhecida da antiga linhagem real na moderna Índia que revelou publicamente ser gay. Em janeiro de 2008, ao realizar uma cerimônia anual em Rajpipla em homenagem a seu bisavô Maharaja Vijaysinhji, Manvendra Gohil anunciou planos para adotar uma criança, dizendo: "Tenho cumprido todas as minhas responsabilidades como príncipe até agora e continuarei enquanto eu puder. Irei também adotar um filho em breve, para que todas as tradições continuem". Se a adoção se concretizar, este será o primeiro caso conhecido de um gay que adota uma criança na Índia. Ao visitar o Brasil por ocasião da Parada do orgulho LGBT de São Paulo, declarou: "Adotar uma criança é fácil na Índia, e não há problema pelo fato de ser abertamente homossexual. Espero estar com meu filho logo depois da volta do Brasil". Além de sua luta pelos direitos LGBT e no combate à Aids, é um fazendeiro orgânico, lutando contra o uso dos pesticidas. Casou-se aos 15 anos, por imposição familiar, mas revelou sua homossexualidade aos 27, quando se separou. A partir daí, sua vida mudou radicalmente, sendo perseguido pela mídia e perdendo amigos, que ficaram receosos de serem apontados como gays.

“Sou o único membro de uma família na real no mundo que se assumiu gay, mas certamente não sou o único gay”.

1.19.2010

Haiti


Bonitos esforços de solidariedade pelo mundo em prol das vítimas do terremoto do Haiti. Doações de grandes quantias de dinheiro, envios de medicamentos e alimentos para este que é o país mais pobre da América Latina e um dos países mais pobres do mundo. Cuba, que sofre um embargo econômico há décadas, liberou o espaço aéreo para os aviões norte-americanos que enviam ajuda (o que encurtou a viagem em 90 minutos). A França criou selo para ajudar as vítimas. O Mc Donald's doa R$ 1,00 por cada Big Mac comprado para os feridos pela tragédia. Artistas realizam shows beneficentes para levantar fundos. Gostaria de saber se as ajudas vão durar enquanto houver sangue, dor, sofrimento e exploração desenfreada da mídia. Imagens de corpos, gritos e desespero pipocam em sites e na televisão diariamente. Sempre quando alguma tragédia abala algum país subdesenvolvido, sou muito pessimista em relação à durabilidade da solidariedade e da comoção pela causa. Foi quando aconteceu o Tsunami, na Ásia, em 2004, que consumiu quase 300 mil vidas. Muita campanha e doação no começo, ostracismo meses depois. Não só em tragédias naturais. Muitos países da África sofrem há décadas com guerras civis, fome, AIDS, miséria e desnutrição. E todos os outros países sabem disso. Infelizmente, milhares de pessoas perderam suas vidas em um país tão pobre como o Haiti. E é preciso muito mais que lágrimas e migalhas para mudar o mundo.